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Guerra Comercial e Conteúdo Digital: Como a China utiliza redes sociais na Disputa Tarifária com os EUA

A recente escalada de sanções e tarifas comerciais entre Estados Unidos e China transformou a economia global em um cenário complexo de disputas econômicas. Nesse contexto, surgiu uma nova frente estratégica: o conteúdo digital. Plataformas como o TikTok e Instagram passaram a desempenhar um papel inesperado, porém decisivo, nesse confronto econômico.

Produtores de conteúdo chineses têm viralizado vídeos revelando bastidores surpreendentes sobre a fabricação de produtos de luxo ocidentais. O fenômeno, que rapidamente se espalhou pelas redes sociais, mostra detalhadamente como marcas renomadas, tradicionalmente associadas à produção em países europeus ou nos Estados Unidos, têm grande parte dos seus processos produtivos realizados na China. Apenas etapas finais, como pequenos ajustes ou embalagens, ocorrem nos países de origem dessas marcas, o que permite legalmente a inclusão da etiqueta “Made in“.

Essa revelação não é apenas uma curiosidade sobre os bastidores da indústria do luxo. Trata-se de uma estratégia deliberada, em que o conteúdo digital se torna uma ferramenta poderosa na guerra comercial. Ao expor essas práticas produtivas, os produtores chineses desafiam a percepção global sobre o valor agregado desses produtos e pressionam economicamente as marcas envolvidas, consequentemente, impactando os governos associados a elas.

Vídeos populares, frequentemente acompanhados por trilhas sonoras envolventes e legendas provocativas, acumulam milhões de visualizações, impulsionando debates sobre autenticidade e valor real dos produtos. Um exemplo emblemático são os vídeos que demonstram passo a passo a fabricação de bolsas de luxo, sapatos exclusivos e eletrônicos sofisticados – todos majoritariamente produzidos em fábricas chinesas.

O impacto desse tipo de conteúdo digital é significativo. Além de gerar questionamentos sobre transparência e valor real das marcas, também afeta diretamente o debate sobre tarifas comerciais. Ao evidenciar como a manufatura desses bens depende criticamente da infraestrutura industrial chinesa, os produtores digitais expõem vulnerabilidades econômicas, pressionando implicitamente o governo dos Estados Unidos a reconsiderar suas posições tarifárias.

É importante salientar que essa estratégia, apesar de claramente alinhada aos interesses comerciais da China, é conduzida por indivíduos e não diretamente pelo governo chinês. Porém, fica evidente como o ambiente digital contemporâneo oferece uma plataforma eficaz para influenciar opiniões públicas e políticas econômicas em escala global.

Em última análise, esses vídeos revelam uma nova dinâmica na utilização estratégica do conteúdo digital. Mais do que entreter, informar ou vender, o conteúdo produzido atualmente nas redes sociais tornou-se uma ferramenta ativa de pressão econômica e política. Esse fenômeno amplia a compreensão sobre como plataformas digitais são cada vez mais importantes na disputa por influência global.

A guerra tarifária entre China e Estados Unidos evidencia, portanto, que o futuro das disputas comerciais poderá depender não apenas de tarifas ou sanções tradicionais, mas também da capacidade de utilizar o ambiente digital para moldar percepções e exercer pressões econômicas de forma inovadora e eficaz.

Daniel Callejon Barani
Sócio – Scartezzini Advogados Associados

daniel.barani@scartezzini.com.br

Publicado 16/04/25 por Daniel Barani.


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