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Dark Patterns no Marketing Jurídico: Desafios Éticos e Legais na Era Digital

No cenário atual, o marketing digital tornou-se uma ferramenta essencial também para escritórios de advocacia, auxiliando na conquista e fidelização de clientes. Contudo, é crucial observar que estratégias persuasivas não ultrapassem limites éticos e legais impostos pelo exercício da advocacia. Entre práticas controversas que surgem nessa esfera estão os chamados “Dark Patterns”, técnicas de design utilizadas para influenciar ou manipular os usuários, levando-os a realizar ações involuntárias ou mal informadas.

Neste artigo, exploramos o conceito de “Dark Patterns”, sua aplicação em campanhas de marketing jurídico, e os desafios éticos e legais associados a essas práticas, especialmente diante das exigências da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

O que são Dark Patterns?

O termo “Dark Patterns” refere-se a técnicas de design de interface e experiência do usuário (UX/UI) elaboradas para manipular usuários a agir de forma que talvez não o fariam naturalmente. Essas práticas podem ser discretas ou mais óbvias, variando desde manipulação sutil até estratégias claramente enganosas.

Entre as categorias mais comuns destacam-se:

 – Confirmshaming: Trata-se do uso de linguagem emocional negativa para pressionar o usuário a aceitar uma oferta ou realizar uma ação. Por exemplo, uma mensagem como “Não, prefiro perder oportunidades valiosas” ao rejeitar uma oferta.

 – Roach Motel: Técnica onde é fácil entrar em um serviço, mas difícil cancelá-lo ou sair dele. Um exemplo clássico ocorre em assinaturas difíceis de cancelar.

 – Misdirection: Estratégia que direciona a atenção dos usuários para longe das opções mais vantajosas, geralmente destacando ou ocultando informações críticas para favorecer a decisão desejada pelo fornecedor.

Essas práticas, ainda que possam momentaneamente aumentar taxas de conversão, geram grandes riscos para a reputação de escritórios jurídicos, violando princípios éticos essenciais à profissão.

Aspectos Legais e Éticos no Marketing Jurídico

A advocacia brasileira é regida por normas éticas rigorosas, especialmente no que tange à publicidade. O Provimento nº 205/2021 do Conselho Federal da OAB regulamenta claramente as práticas permitidas e proibidas em campanhas de marketing jurídico.

O artigo 4º do referido provimento destaca que qualquer publicidade deve observar princípios éticos como discrição, sobriedade e caráter informativo, vedando práticas que induzam a erro ou prometam resultados específicos.

Ademais, as práticas que se valem de Dark Patterns frequentemente conflitam com tais princípios, sobretudo em casos de Confirmshaming e Misdirection, por manipular a decisão consciente do cliente. Essa manipulação prejudica não apenas a relação entre cliente e advogado, mas viola diretamente a exigência ética de clareza e transparência.

No âmbito da proteção de dados, a LGPD também impõe obrigações rigorosas. Dark Patterns que dificultam ou obscurecem o consentimento livre e informado dos usuários infringem diretamente princípios como transparência e finalidade, essenciais à conformidade com a lei.

Além disso, práticas enganosas e manipulativas podem configurar violação ao Código de Defesa do Consumidor, aplicável também às relações de prestação de serviços jurídicos na medida em que se configuram relações de consumo.

Boas Práticas no Marketing Jurídico

Para evitar riscos éticos e legais, escritórios de advocacia devem adotar práticas alinhadas à legislação e aos princípios éticos da profissão:

1. Transparência Absoluta: Todas as informações devem ser claramente apresentadas, evitando ambiguidades ou termos que possam induzir ao erro. Cada interação deve fornecer detalhes precisos sobre serviços, custos e condições contratuais.

2. Consentimento Livre e Informado: Especial atenção deve ser dada ao cumprimento da LGPD. Formulários e interações digitais devem solicitar consentimento claro e explícito dos usuários, garantindo total compreensão e facilidade de revogação.

3. Design Ético e Responsável: Equipes de marketing e designers devem ser orientadas para evitar estratégias que possam manipular ou prejudicar o discernimento dos usuários. A criação de interfaces claras, acessíveis e intuitivas é fundamental.

4. Formação Contínua das Equipes: Promover treinamentos regulares sobre ética profissional, LGPD e boas práticas de UX/UI ajuda a garantir que todos os envolvidos estejam cientes e comprometidos com estratégias éticas e legais.

5. Monitoramento Contínuo: Implementar procedimentos constantes de revisão e auditoria das práticas de marketing, identificando e corrigindo rapidamente potenciais desvios ou práticas questionáveis.

Casos Práticos e Exemplos de Violações

Existem inúmeros exemplos, especialmente internacionais, onde o uso de Dark Patterns gerou consequências legais graves. Em 2023, grandes empresas digitais enfrentaram processos judiciais por práticas de “Roach Motel”, dificultando significativamente o cancelamento de assinaturas por parte dos consumidores.

No contexto brasileiro, embora ainda incipientes, já surgiram denúncias em relação ao uso de Confirmshaming em campanhas agressivas de marketing digital por algumas empresas jurídicas, levantando debates éticos significativos no meio profissional.

Esses casos ilustram como práticas inadequadas podem levar à perda de confiança dos clientes e exposição a sanções legais e administrativas significativas.

Consequências das Violações Legais e Éticas

A adoção de práticas antiéticas como Dark Patterns pode levar a consequências significativas, incluindo:

 – Processos Administrativos e Judiciais: Sanções administrativas impostas pela OAB, como advertências, suspensão e até cassação do registro profissional.

 – Multas pela LGPD: A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) pode aplicar multas pesadas que chegam até 2% do faturamento anual da empresa ou grupo econômico, limitado a R$ 50 milhões por infração.

 – Danos à Reputação: Práticas antiéticas expostas publicamente têm potencial devastador sobre a imagem e reputação dos escritórios envolvidos, prejudicando gravemente a prospecção de clientes e a retenção dos já existentes.

Conclusão

O marketing digital jurídico deve ser conduzido com extremo cuidado, respeitando integralmente os princípios éticos e legais que norteiam a advocacia. Evitar Dark Patterns é essencial não apenas para cumprir regulamentações, mas também para preservar a confiança dos clientes e assegurar o sucesso duradouro do escritório.

Por meio de transparência absoluta, consentimento informado e práticas éticas, os escritórios podem desenvolver estratégias eficazes de marketing digital, fortalecendo sua reputação e garantindo conformidade total com a legislação vigente.

Daniel Callejon Barani
Sócio – Scartezzini Advogados Associados

daniel.barani@scartezzini.com.br

Publicado 04/06/25 por Daniel Barani.


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